Boletim Eletrónico APECA n.º 33 (Março/2020)

Artigo técnico preparado por Carlos Lemos para APECA:

“Desafio COVID-19 vs. Medidas de Combate”

Inúmeros são os transversais constrangimentos, desafios e preocupações, emergentes da pandemia global COVID-19, pelo que a sua resolução será, necessariamente, multilateral, através da imperativa responsabilidade e solidariedade. É consensual a imprevisibilidade da duração do estado de emergência, sendo certo que estamos perante uma prova de resistência, não obstante a urgência na concretização prática de medidas de apoio às famílias, negócios e emprego. A este propósito, importa assinalar, e saudar, o esforço conjunto, permanentemente desenvolvido, com especial destaque para o resultado do Conselho de Ministros, realizado         no passado dia 26 do corrente mês. Com efeito, cumpre enfatizar as medidas aprovadas, publicadas em sete (7) decretos-lei (DL):

» DL n.º 10-F/2020, de 26/03: Cumprimento de obrigações fiscais e contribuições sociais;
» DL n.º 10-G/2020, de 26/03: Proteção dos postos de trabalho;
» DL n.º 10-H/2020, de 26/03: Fomento da aceitação de pagamentos baseados em cartões;
» DL n.º 10-I/2020, de 26/03: Âmbito cultural e artístico, em especial espetáculos não realizados;
» DL n.º 10-J/2020, de 26/03: Proteção dos créditos das famílias, empresas, instituições particulares de solidariedade social e demais entidades da economia social, e, Regime especial de garantias pessoais do Estado;
» DL n.º 10-K/2020, de 26/03: Faltas justificadas motivadas por assistência à família;
» DL n.º 10-L/2020, de 26/03: Aplicação de fundos europeus estruturais e de investimento.

Do supracitado Comunicado do Conselho de Ministros consta, também, a aprovação de duas (2) proposta de lei, a submeter à apreciação da Assembleia da República, relativamente à criação de um regime excecional e temporário de mora no pagamento de rendas, habitacionais e não habitacionais, e, conceção de empréstimos para o pagamento de rendas aos arrendatários que tenham sofrido quebras de rendimentos; bem como ao estabelecimento de um regime excecional de cumprimento das medidas previstas nos Programas de Ajustamento Municipal (PAM).

Impera, ainda, atentar ao conteúdo de duas (2) Declarações de Retificação (Dec. Retific.), n.º 13/2020 e n.º 14/2020, publicadas no dia 28/03, com o propósito de corrigir inexatidões do DL n.º 10-F/2020 e DL n.º 10-G/2020, de 26/03, respetivamente.

O DL n.º 10-F/2020, de 26/03, complementa as medidas anteriormente tomadas, com o escopo de assegurar liquidez às empresas, bem como salvaguardar a prossecução das respetivas atividades económicas e postos de trabalho, através da flexibilização do pagamento de impostos e contribuições sociais, exceto no concernente às quotizações. Este diploma, sem prejuízo do disposto na Lei n.º 1-A/2020, de 19/03, determina, também, a suspensão, até 30 de junho, dos processos de execução fiscal, em curso ou que venham a ser instaurados, pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) e pela Segurança Social (SS). Quanto às prestações por desemprego, assim como outros apoios sociais da SS que garantam mínimos de subsistência, cujo término do período de concessão ou prazo de renovação ocorra previamente a 30/06, é decretada a prorrogação extraordinária da sua atribuição, e, também, a suspensão da reavaliação dos requisitos de manutenção dos referidos apoios sociais. Importa, ainda, assinalar a possibilidade de flexibilizar os termos e condições de pagamento das contribuições devidas à Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores. De notar que, face à identificação de inexatidões, nos artigos n.º 2º, 3º e 5º/1, do normativo em análise, foram objeto de correção, através da Dec. Retific. n.º 13/2020, de 28/03.   

Por sua vez, o DL n.º 10-G/2020, de 26/03, vem reforçar as medidas, inicialmente determinadas, de modo a atenuar os efeitos da crise empresarial, com especial enfoque na manutenção dos postos de trabalho. Face à urgência de clarificação e operacionalização de um mecanismo que responda, com eficácia e eficiência, a esta problemática, é concretizada, finalmente, a definição e regulamentação dos apoios financeiros, aos trabalhadores e empresas, no âmbito da implementação do regime lay-off simplificado. O presente diploma, pretende responder, portanto, às diversas questões inerentes à redução temporária do período normal de trabalho ou suspensão do contrato de trabalho, por facto respeitante ao empregador em situação de crise empresarial, cujo conceito é, por fim, clarificado. Impera sublinhar que, os apoios financeiros, em questão, visam, essencialmente, evitar despedimentos por motivos económicos, ou seja, manter os contratos de trabalho, razão pela qual, durante o período de redução ou suspensão, assim como nos sessenta (60) dias subsequentes à aplicação das medidas de apoio extraordinário à manutenção dos postos de trabalho, o empregador, não poderá cessar os contratos de trabalho, através de despedimento coletivo ou por extinção do posto de trabalho. Cumpre assinalar que as inexatidões, aferidas no último parágrafo do preambulo e nos artigos n.º 15º e 17º, do diploma em questão, foram corrigidas, pela Dec. Retific. n.º 14/2020, de 28/03.   

O DL n.º 10-H/2020, de 26/03, introduz medidas facilitadoras, e de fomento, à utilização, aquando a aquisição de bens e serviços essenciais, de instrumentos de pagamento eletrónicos (p.ex: cartão), ao invés dos meios tradicionais (notas e moedas).

No âmbito cultural e artístico, com enfoque nos espetáculos não realizados, o DL n.º 10-I/2020, de 26/03, estabelece um regime excecional de proteção especial aos agentes culturais relativamente aos espetáculos não realizados, agendados entre o dia 28 de fevereiro e o nonagésimo (90º) dia útil seguinte ao término do estado de emergência. Com o propósito de salvaguardar a sustentabilidade dos agentes culturais no âmbito da atividade de produção, criação e realização de espetáculos, este normativo possibilita que, em caso de reagendamento de espetáculos, as entidades públicas promotoras se possam socorrer dos regimes de revisão e/ou adiantamento de preços, bem como de bens, serviços ou trabalhos complementares. Caso se verifique a impossibilidade de reagendamento dos espetáculos, e, consequentemente, imperativo cancelamento, as entidades públicas promotoras podem realizar o pagamento, na respetiva proporção, dos compromissos assumidos, e, efetivamente efetuados.
Lamentavelmente, o diploma em análise não contempla qualquer medida específica para os artistas, os quais se encontram numa situação deveras preocupante. Com efeito,  de momento, os apoios disponíveis, para estes profissionais, correspondem às medidas, determinadas para os trabalhadores dependentes e independentes, consagradas nos diplomas DL n.º 10-A/2020, de 13/03; DL n.º 10º-J/2020, de 26/03; e DL n.º 10-F/2020, de 26/03.   

O DL n.º 10-J/2020, de 26/03, por seu turno, institui um conjunto de medidas excecionais de proteção dos créditos particulares, empresas, instituições particulares de solidariedade social (IPSS) e demais entidades da economia social, e, ainda, um regime especial de garantias pessoais do Estado. Tais medidas visam, portanto, proteger as famílias, em matéria de crédito à habitação própria e permanente, e as empresas, no âmbito do reforço da tesouraria e liquidez. Impera sublinhar que, os enunciados regimes de proteção, abrangem, também, os empresários em nome individual (ENI), as IPSS, as associações sem fins lucrativos, assim como as demais entidades da economia social. Cumpre assinalar, ainda, a consagração de moratória, até 30 de setembro do corrente ano, a qual proíbe a revogação de linhas de crédito contratadas, e, ainda, a prorrogação ou suspensão dos créditos, durante tal período. De notar, também, que, o diploma em questão, estabelece um regime das garantias pessoais do Estado, e facilita, temporariamente, quando aferidos determinados pressupostos, a prestação de concessão de garantias por parte de sociedades de garantia mútua.

O DL n.º 10-K/2020, de 26/03, protagoniza o reforço das condições, atribuídas às famílias, no concernente à prestação de assistência a filhos menores, durante os períodos de interrupção letiva determinados. Simultaneamente, visa acautelar situações de assistência a parente, ou afim, na linha reta ascendente, quando se encontre a cargo do trabalhador e frequente equipamentos sociais cuja atividade seja suspensa. Salvaguarda, ainda, a situação profissional dos bombeiros voluntários, que trabalham no setor privado e social, e, que necessitam faltar ao trabalho, para desempenho de serviço de socorro e de transporte de doentes, no âmbito da pandemia da doença COVID-19.  

O DL n.º 10-L/2020, de 26/03, por sua vez, determina que a liquidação dos incentivos, respeitantes aos fundos europeus estruturais e de investimento, deve ocorrer o mais brevemente possível, aquando a validação do requerimento de pagamento, podendo, inclusive, ser realizado a título de adiantamento, sendo, posteriormente, regularizado.
        
Impera destacar, ainda, o Despacho n.º 129/2020-XXII, de 27/03, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, emitido no seguimento do Despacho n.º 104/2020-XXII, de 09/03, sendo recomendável a sua atenta leitura, dada a importância, sendo determinadas medidas adicionais sobre as declarações periódicas mensais de IVA, e respetivas declarações de substituição; as faturas eletrónicas; e a figura do justo impedimento, no cumprimento de quaisquer obrigações fiscais, relativamente a contribuintes ou contabilistas certificados.     

Não obstante os esforços desenvolvidos, no concernente à determinação de medidas de combate à pandemia COVID-19, será desejável/exigível o alargamento do seu âmbito, assim como a implementação de outros mecanismos que potenciem, e agilizem, os apoios a quem mais precisa. A este propósito, seria recomendável introduzir benefícios fiscais extraordinários, em IRS e IRC, com aplicação imediata, ou seja, ao período económico de 2019. A título exemplificativo, sugere-se o aumento das majorações dos donativos, bem como a redução ou dissipação das taxas de tributação autónoma, para os sujeitos passivos que contribuam, pecuniariamente ou em espécie.

Da discussão nasce a luz. Todo o contributo é bem-vindo. Seguimos juntos!

Carlos Lemos
Fiscalista (AFP/IFA) 30/03/20120


Artigo técnico preparado por Carlos Lemos para APECA: “Desafio COVID-19 vs. Medidas de Combate”

Publicado no Boletim Eletrónico APECA n.º 33 (Março/2020)


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